BEM VINDO!

Relaxe e Pense!!!!

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

NÃO SE VISITA MAIS

Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. 
Lembro-me  de  minha  mãe  mandando  a  gente  caprichar  no  banho  porque  a
família  toda  iria  visitar  algum  conhecido.  Íamos  todos  juntos,  família  grande,
todo mundo a pé. 
Geralmente, à noite.
Ninguém avisava nada, o costume era chegar de paraquedas mesmo. E os
donos  da  casa  recebiam  alegres  a  visita.  Aos  poucos,  os  moradores  iam  se
apresentando, um por um.

 – Olha o compadre aqui, garoto! Cumprimenta a comadre.
E o garoto apertava a mão do meu pai, da minha mãe, a minha mão e a mão
dos meus irmãos. 

Aí chegava outro menino. Repetia-se toda a diplomacia.

 – Mas vamos nos assentar, gente. 
Que surpresa agradável


   A conversa rolava solta na sala. 
Meu pai conversando com o compadre e minha mãe de papo com a comadre.

Eu  e  meus  irmãos  ficávamos  assentados  todos  num  mesmo  sofá,
entreolhando-nos e olhando a casa do tal compadre. 

Retratos  na  parede,  duas  imagens  de  santos  numa  cantoneira,  flores  na
mesinha de centro... casa singela e acolhedora. 
A nossa também era assim.

   Também eram assim as visitas, singelas e acolhedoras. 

Tão acolhedoras que era também costume servir um bom café aos visitantes.
Como um anjo benfazejo, surgia alguém lá da cozinha – geralmente uma das
filhas – e dizia:

   – Gente, vem aqui pra dentro que o café está na mesa.
Tratava-se de uma metonímia gastronômica. 

O  café  era  apenas  uma  parte:  pães,  bolo,  broas,  queijo  fresco, 
manteiga,

biscoitos, leite... tudo sobre a mesa.

   Juntava todo mundo e as piadas pipocavam


As gargalhadas também. 
Pra que televisão?
 Pra que rua? 
Pra que droga? 
A vida estava ali, no riso, no café, na conversa, no abraço, na esperança... 

Era  a  vida  respingando  eternidade  nos  momentos  que  acabam....  era  a  vida
transbordando simplicidade, alegria e amizade...
    Quando  saíamos, os donos da casa ficavam à porta  até que virássemos a
esquina. Ainda nos acenávamos. 

E voltávamos para casa, caminhada muitas vezes longa, sem carro, mas com
o coração aquecido pela ternura e pela acolhida. 

Era  assim  também  lá  em  casa.  Recebíamos  as  visitas  com  o  coração  em
festa.. A mesma alegria se repetia. Quando iam embora, t ambém ficávamos, a
família toda, à porta. Olhávamos, olhávamos... até que sumissem no horizonte
da noite.

   O tempo passou e me formei em solidão. Tive bons professores: televisão,
vídeo, DVD, e-mail... 
Cada  um  na  sua  e  ninguém  na  de  ninguém.  Não  se  recebe  mais  em  casa.
Agora  a  gente  combina  encontros  com  os  amigos  fora  de  casa:
   – Vamos marcar uma saída!.... 
– ninguém quer entrar mais.
    Assim,  as  casas  vão  se  transformando  em  túmulos  sem  epitáfios,  que
escondem mortos anônimos e possibilidades enterradas. 
Cemitério urbano, onde perambulam zumbis e fantasmas mais assustados que
assustadores.
   Casas trancadas.. Pra que abrir? O ladrão pode entrar e roubar a lembrança
do  café,  dos  pães,  do  bolo,  das  broas,  do  queijo  fresco,  da  manteiga,  dos
biscoitos do leite.
   Que saudade do compadre e da comadre!









domingo, 31 de outubro de 2010

ACASO


"Cada um que passa em nossa vida,

passa sozinho, pois cada pessoa é única

e nenhuma substitui outra.

Cada um que passa em nossa vida,

passa sozinho, mas não vai só

nem nos deixa sós.

Leva um pouco de nós mesmos,

deixa um pouco de si mesmo.

Há os que levam muito,

mas há os que não levam nada.

Essa é a maior responsabilidade de nossa vida,

e a prova de que duas almas

não se encontram ao acaso. "



Antoine de Saint-Exupéry


sexta-feira, 29 de outubro de 2010

TOLERÂNCIA



Das coisas mais difíceis que há. Isso é que é a tolerância.

Você e eu somos diferentes. Em maior ou menor grau, somos diferentes. Pensamos diferente, cremos diferente e mesmo nas semelhanças somos diferentes. Mas eu e você não vivemos em uma ilha isolada e portanto temos que conviver. E aí a coisa fica complicada.

É assim na vida.

Na nossa vida aparecem pessoas de todo jeito, com crenças, posturas, opiniões e modo de se expressar os mais variados. Concordo com alguns, discordo de muitos, me identifico plenamente com poucos e me pareço com uns 3 ou 4. E aprendo com todos, sem exceção.

Ainda que não adote para minha vida a opinião de todos, eu aprendo. Especialmente sobre tolerância e aceitação.

E tenho uma experiência de vida que quero repartir com você:

É melhor ser feliz do que ter razão. Eu, durante muito tempo da minha vida, dei murro em ponta de faca. Achava que para viver bem e ser feliz a minha verdade precisava ser aceita. Afinal, eu estava com a razão…

Mas a vida não é assim. Ninguém é possuidor da verdade total, e o que serve a mim pode não servir para mais ninguém.

Parece frase de livro de auto-ajuda mas não é. É algo que aprendi e me fez melhor. 

Melhor para mim e para quem convive comigo.

Claro que isso não significa perder a personalidade e virar vaquinha de presépio (aquela que só fica balançando a cabeça fazendo sim). Mas manter a postura e querer impô-la aos demais é muito diferente.

Como eu disse, na nossa vida há pessoas de todo jeito passeando pelos corredores, se encontrando, se descobrindo. Afinal são tantas crenças, tantos contrastes…E exercitar a tolerância é, para mim, o grande achado dos últimos tempos!

Sabe por quê?

Porque a tolerância detém a violência e faz florescer a paz.

E paz é o que eu quero mais!

Frase para pensar:
Tolera. Tolera a verdade alheia na mesma medida em que queres que seja tolerada a tua.

Um beijo no coração

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

“SOBRE A PSICANÁLISE”

Todos ouvem o que vc fala, os amigos escutam o que vc diz e o psicanalista presta atençaõ ao que vc não diz!

A psicanálise surge da ambivalência e da incoerência e direciona seu olhar para o homem com todas as suas contradições. Pensando a psicanálise, eu penso sobretudo o quê é ser humano e as consequências disso. Para Freud, e depois para Lacan, é a partir dos tropeços e do inconsciente que o homem pode ser configurado como sujeito.

Hoje vivemos uma busca do sujeito como signo de uma época, visto que isso se encontra impresso nas ações e nos sintomas contemporâneos. Fazemos parte de uma sociedade deprimida, que faz calar o desejo de se engajar e de se posicionar na sua singularidade.

A modernidade nasce de uma necessidade de rompimento com a tradição e com uma ânsia de autonomia, mas, muitas vezes, o sujeito se perde aí. A psicanálise, está imbuída desse espírito de se comprometer na busca da verdade do sujeito- daí sua face de não- conformidade em contraposição à falta de perspectivas realmente libertárias dos tempos atuais.
Ser psicanalista é antes de tudo focar seu olhar no outro, dentro do universo do outro, mas antes sem se esquecer da sua essência pois,  todo psicanalista não só tem o seu método: ele próprio é esse método.
Márcia Frati e Ricardo Ribeiro

domingo, 26 de setembro de 2010

QUEM É NOSSO VAMIPIRO?

Às vezes é difícil nos desvincilharmos de algumas heranças do passado, das quais gostaríamos de nos ver livres o quanto antes.

São companhias, assuntos e situações que parecem nos arrastar para um tempo do qual não temos a menor saudade, que poderia ter sido diferente ou simplesmente não ter acontecido.

Certa vez li uma pequena análise sobre a obra "Drácula", de Bram Stoker, que nunca mais esqueci. Talvez por retratar perfeitamente isso que tento explicar.

O autor, Richard Noll, em seu livro "O culto de Jung", dizia o seguinte:

"Rei dos vampiros, Drácula é o perfeito horror cultural do fim de século: algo que, embora continue vivo há séculos, ainda assim está morto; um morto-vivo que suga a vitalidade dos vivos, tal como fazia a própria civilização europeia."

Essa é uma imagem perfeita para o que me refiro. Um passado que nos persegue não é nada mais que isso: um morto que permanece vivo e suga nossa energia vital. Um fardo, um parasita, um hospedeiro que vive sobre nossos ombros e que lutamos e sacudimos com violência para lançar ao chão, mas que sempre volta.



 

terça-feira, 14 de setembro de 2010

A VERDADE DÓI...


Nunca estamos preparados para ouvir a verdade, pricipalmente quando esta verdade vai de encontro a nossa imagem.
Estar preparado para ouvir verdades é sinal de amadurecimento e crescimento interior.
Temos que estar bem com nossa auto-imagem, afinal "é o que temos para o momento" e se uma gordurinha aqui, uns quilinhos a mais na balança ou uma barriguinha estão te incomodando, não deixe que isso estrague o seu dia e nem deixe de usar aquela roupa nova, só porque ela não ficou da maneira que você se imaginava nela, afinal hoje é o dia!
E a melhor de todas as dicas: ouça a verdade que o outro está dizendo sem maiores dramas, pense a respeito e pergunte-se que importância tem essa verdade na minha vida e mais...essa também é a minha verdade?
Porque a melhor de todas as verdades é sermos verdadeiros conosco mesmo.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

O HOMEM IDEAL

O homem ideal


Ele existe, sim. E, graças a Deus, está muito longe da perfeição.

O homem ideal me faz rir, mas nunca usa o riso contra mim. Tem a rara habilidade de saber ouvir e só diz o que é necessário, bom ou a dura e intransponível realidade.

Compreende a diferença entre estar presente e fazer companhia.

Não é prolixo, nem tenta impressionar. Não precisa entender de vinho, charutos ou golfe; precisa ser autêntico e admitir que não entende de vinho, charutos nem de golfe (e eventualmente confessar que gosta mesmo é de pinga). Ele não exige a todo instante meu lado risonho porque sabe como sabe de tantas outras coisas não ditas em sentenças ou discursos, que os dias negros fazem parte de mim.

Nota as sutis alterações de humor pelo tom da minha voz e, antes de prejulgar as razões, se predispõe a fazer cafuné ou, sensato, cala-se ao meu lado olhando para a TV. E não exige explicações porque possui uma calma sabedoria que me impele em sua direção: dividir minhas angústias e anseios com este homem é tão acolhedor quanto deitar na grama sob o sol de outono. O homem ideal me dá bronca quando abuso da minha independência ou como chocolate demais e depois reclamo do peso. Ele compra sorvete light e evita discussões posteriores. Compreende que preciso da sensação indescritivelmente libertadora de sumir por algumas horas e, mesmo não concordando com ela, não me interroga como um oficial do DOI-Codi quando piso em casa, levemente para não o acordar, às 2 da manhã.

O homem ideal canta. Não precisa ser afinado, mas sussurra (seja ao telefone ou ao vivo) canções que, num dia qualquer, mencionei gostar. Pode saber dançar. E, se não souber, que mantenha a dignidade e fique sentadinho me observando. Também bebe. Meio pinguço é daqueles que ficam charmosos de matar com um copo de uísque nas mãos. É deliciosamente sacana três doses acima do normal. Enterra os bons modos e fecha abruptamente a porta do quarto, sem tempo para que eu responda à pergunta nem sequer formulada. Adormece aconchegado a mim, mas não suporta ficar agarrado durante toda a noite.

E também curte cozinhar. Diverte-se tanto numa loja de condimentos como diante de uma prateleira de CDs. Não me expulsa da cozinha mesmo que eu esteja atrapalhando. Não me dá fusilli na boca, mas o serve no meu prato, com pouco queijo e muito molho.

O homem ideal está sempre disposto a me ouvir, mesmo que seja nos minutos desagendados à força durante o dia cheio, e não usa trabalho nem cansaço como desculpa para suas eventuais faltas; as assume e até se desculpa. Não se esquiva de discutir os problemas que não se solucionam com notas de 100. Não considera fraqueza dizer que me ama. Pede ajuda quando sente que o peso colocado sobre seus ombros extrapolou sua força. E chora. Não faz promessas porque sabe que nem sempre é possível cumpri-las. Vive regido por sua consciência, mas, impulsivo, assassina a etiqueta e comete atos passionais. Então faz besteiras, erra, engana-se. E nem por isso deixa de ser maravilhoso - apenas segue sendo magnífica e tropegamente humano.

O homem ideal é imperfeito, numa imperfeição que combina exatamente com a minha.

Escrito por Ailin Aleixo

domingo, 15 de agosto de 2010

Prá quem me odeia...


Ótimo texto da Fernanda Young!




Eu te amo. E não seria metade do que sou sem você, juro.


É seu ódio profundo que me dá forças para continuar em frente, exatamente da minha maneira.


Prometa que nunca vai deixar de me odiar ou não sei se a vida continuaria tendo sentido para mim.


Eu vagaria pelas ruas insegura, sem saber o que fiz de tão errado.


Se alguém como você não me odeia, é porque, no mínimo, não estou me expressando direito.


Sei que você vive falando de mim por aí sempre que tem oportunidade, e esse tipo de propaganda boca a boca não tem preço.


Ainda mais quando é enfática como a sua - todos ficam interessados em conhecer uma pessoa que é assim, tão o oposto de você.


E convenhamos: não existe elogio maior do que ser odiado pelos odientos, pelos mais odiosos motivos.


Então, ser execrada por você funciona como um desses exames médicos mais graves, em que "negativo" significa o melhor resultado possível.


Olha, a minha gratidão não tem limites, pois sei que você poderia muito bem estar fazendo outras coisas em vez de me odiar - cuidando da sua própria vida, dedicando-se mais ao seu trabalho, estudando um pouco.


Mas não: você prefere gastar seu precioso tempo me detestando.


Não sei nem se sou merecedora de tamanha consideração.


Bom, como você deve ter percebido, esta é uma carta de amor.


E, já que toda boa carta de amor termina cheia de promessas, eis as minhas:


Prometo nunca te decepcionar fazendo algo de que você goste. Ao contrário, estou caprichando para realizar coisas que deverão te deixar ainda mais nervoso comigo.


Prometo não mudar, principalmente nos detalhes que você mais detesta. Sem esquecer de sempre tentar descobrir novos jeitos de te deixar irritado.


Prometo jamais te responder à altura quando você for, eventualmente, grosseiro comigo, ao verbalizar tão imenso ódio. Pois sei que isso te faria ficar feliz com uma atitude minha, sendo uma ameaça para o sentimento tão puro que você me dedica.


Prometo, por último, que, se algum dia, numa dessas voltas que a vida dá, você deixar de me odiar sem motivo, mesmo assim continuarei te amando. Porque eu não sou daquelas que esquece de quem contribuiu para seu sucesso.


Pena que você não esteja me vendo neste momento, inclusive, pois veria o meu sincero sorrisinho agradecido - e me odiaria ainda mais.






Com amor, da sua eterna." Fernanda Young.

Conhece-te a ti mesmo!!!

Conhecer-se é uma viagem necessária e dolorosa. Temos que chegar ao templo da alma, um museu tumultuado de emoções e sentimentos. Temos que recordar para perceber o que ficou pelo caminho por decisão ou imposição. Somos o resolveram por nós ou o que ousamos ser? Agimos embalados por emoções precárias que nos garantam algum aplauso ou intrigamo-nos com a descoberta da verdade que se esconde dentro de nós com a porta fechada aos apressados?



Temos medo de nos conhecer...


Agimos por impulso para que a ação não seja filha da reflexão, até por que a reflexão nos impede de muitos mimos de que não queremos abrir mão. Fazemos o que nos torna menores por preguiça de nos elevarmos ao nosso devido lugar. A nós compete essa posição. O convite é o melhor lugar possível e mesmo assim nos emporcalhamos de quinquilharias por medo da frase: Conhece-te a ti mesmo!

terça-feira, 13 de julho de 2010

Sobre os Limites

Autoria: Miriam Altman e Muna Maalouli
Fazer uma reflexão sobre a importância dos limites, considerando-o como aspecto fundamental na vida de todos os seres humanos e sobretudo na educação infantil, implica na consideração de vários fatores envolvidos.
Um deles refere-se a presença do sentimento de frustração, nas situações onde a realidade se apresenta impondo restrições e limites. Frente á frustração são experimentados sentimentos de dor, raiva, contrariedade e ódio.
Observamos que muitas vezes a tendência das pessoas é de não reconhecer esses sentimentos e tentar negar a realidade ou mesmo fugir e fingir que nada ocorre; outras se sentem mais capazes de entrar em contato com essas vivências e a partir delas encontrar alternativas. Fato que demanda um certo amadurecimento.
O sentimento de frustração pode tornar-se muito freqüente em função do desejo da criança que é ilimitado e não leva ainda em conta os aspectos da realidade. É característica da natureza do desejo que este seja ilimitado, desmedido impregnado por fantasias de tudo querer e de tudo poder. Só com o desenvolvimento e com a ajuda do adulto é que a criança pode ir aprendendo a restringir certas vontades, a trocar uma coisa por outra, a aceitar que existe uma hora para cada atividade e que mesmo que algo seja prazeroso, em certo momento pode precisar ser deixado de lado e substituído por outra coisa .
Este é também um aspecto bastante importante a ser considerado, que é o da onipotência dos pensamentos , fantasias e desejos infantis. A criança imagina que de fato é toda poderosa e fica muito assustada com a força e intensidade que seus sentimentos podem ter. Se por exemplo esta hostil pode imaginar que a sua raiva pode atingir a mãe de forma destrutiva e arrasadora e como conseqüência pode sentir-se culpada e deprimida. O sentimento de culpa também indica que a mãe que naquele momento esta sendo tão odiada também é a mãe amada da qual a criança depende e nutre fortes sentimentos amorosos. Na fantasia da criança o amor que também é vivido intensamente pode ser expresso como voracidade; vontade de sugar a mãe toda para dentro de si e mantê-la presa e sob controle.
È importante ressaltar que estamos falando de mecanismos mentais bastante primitivos, no sentido de que fazem parte dos primórdios da vida psíquica. Faz parte desse começo esta forma indiscriminada de lidar com o mundo interno e com o externo, com o que é fantasia e o que è realidade. A criança desta forma dá asas a sua onipotência pois não esta ainda habituada a confrontar seu mundo de fantasias com a realidade e com os fatos. Pois a realidade indica que ela é um ser bastante dependente, precisa da permissão dos pais para quase tudo, seu poder de decisão é bastante restrito e tem pouca autonomia.
Temos observado que a brincadeira e a dramatização são formas úteis onde a criança pode expressar seus desejos de imitar o adulto e de exercitar o seu "poder" sem conseqüências danosas para ela. Neste sentido a escola pode ter uma função muito importante, pois se torna um lugar privilegiado para este aprendizado, na medida em que a criança passa pela "socialização" onde todas estas experiências estarão presentes.
Por todas estas razões , este é um processo lento, bastante trabalhoso pois implica em renúncias. Não é fácil para a criança e nem para o adulto abandonar algo conhecido e prazeroso. Freud, em seu artigo " Os dois princípios do funcionamento mental" nos esclarece quanto a estas questões. Descreve dois modos pelo qual o aparelho mental funciona. O primeiro é regido pelo princípio de prazer/ desprazer; o outro pelo princípio da realidade.
N o primeiro modo o que predomina é a busca do prazer a qualquer custo e este é conseguido através da descarga de qualquer aumento de tensão. Se a criança esta com raiva do amigo, vai lá e empurra, chuta, bate ou morde. Dessa forma se vê temporariamente livre do desconforto do aumento de tensão interna através deste tipo de descarga motora e corporal.
No segundo modo, o que se considera é a realidade. Está em jogo também a possibilidade de antecipar a ação através do pensamento. A criança já pode considerar o amigo de outra forma possivelmente não precisara bater, poderá se expressar através de palavras. Isso implica numa maior tolerância com relação ao seu próprio desconforto e aumento de tensão interna.
Os pais e educadores se encontram frente a uma situação difícil e delicada, não é fácil pegar o filho na escola e encontrá-lo com uma marca roxa na bochecha . É importante considerar que a presença do adulto pode restringir certas atitudes das crianças, mas não é possível impedir que aconteça , principalmente num grupo de crianças onde esta forma de expressão ainda é a que prevalece. Todas as crianças passam por esta fase, é importante notar que é algo passageiro e que logo que lhes é possível vão encontrando outros modos de expressar seus sentimentos.
Linguagem e pensamento são aquisições posteriores, que vêem com o desenvolvimento intelectual e sobretudo emocional. Neste sentido podemos observar um movimento no desenvolvimento infantil com relação a expressão das emoções, que vai dos aspectos mais concretos e corporais para formas mais abstratas e complexas que incluem a linguagem, a capacidade para a simbolização e para o pensar. Com relação ao desenvolvimento cognitivo Jean Piaget chegou a conclusões muito próximas a estas. Faz parte do desenvolvimento, fazer renúncias e abrir mão de coisas conhecidas. Freud chama a atenção para o fato de que o homem só pôde criar a civilização a partir do momento em que aceitou dolorosamente abrir mão dessas formas arcaicas e primitivas de convivência. A civilização e a cultura só podem ocorrer com a inclusão de formas mais evoluídas como a linguagem, a simbolização, a arte, a música e outras acessíveis á capacidade de desenvolvimento do ser humano.
Outra visão a respeito dessas questões foi muito bem estudada pela psicanalista inglesa Melanie Klein, através de sua experiência clínica e de uma observação bastante cuidadosa, ela nos diz que o amor e o ódio fazem parte da natureza dos sentimentos humanos.
Quando o bebê passa pela experiência da frustração (por exemplo, se está com fome e tem que aguardar a presença da mãe para ser alimentado) vive uma situação interna caótica e desorganizada. Em contrapartida, quando está saciado e gratificado recupera um bem estar e uma organização. As primeiras experiências emocionais são vividas de forma tal que, quando a mãe atende às necessidades do bebê ela é "boa" e, ao contrário, quando o frustra, ela é "má". No primeiro caso, a criança pequena identifica a mãe como a "fada", ou seja, aquela que tudo pode e tudo dá. Opostamente, ao frustrar-se, a criança identifica a mãe como a "bruxa" que nada tem de bom a oferecer. Por isso os contos de fada fazem tanto sentido para o mundo interno da criança, pois retratam a oposição entre o bem e o mal. Assim inicialmente os processos psíquicos infantis caracterizam-se por vivências intensas e parciais em relação ao outro que frustra ou gratifica . Quando gratifica, o outro é amado, adorado e querido; no momento seguinte em que a criança é frustrada o outro passa a ser objeto da agressão, ódio e maldade.
Na vivência ligada à gratificação , quando a criança esta atendida e satisfeita a tendência é a idealização do outro. A mãe passa a ser vista como um ser perfeito, toda poderosa, não tem limites e pode dar tudo.
A característica destas vivências parciais é que a mudança de estado é brusca e pode ir de um extremo ao outro- da idealização ao ódio profundo ou vice- versa. Estas vivências fazem parte da vida mental de todos nós, quanto mais jovem e menos amadurecido, mais intensas e extremas elas se apresentam. A noção do outro como ser independente e separado, como aquele que frustra e ao mesmo tempo gratifica é bem posterior. Nestas primeiras e primitivas vivências , o que é bom esta dentro, o mau esta fora, desta forma não há responsabilidade pessoal. Por exemplo, o outro é responsável pela minha dor, por eu ter caído, por ter me machucado, por não conseguir fazer as coisas, etc...
Somente quando a criança percebe que a mãe, as pessoas e a realidade não são totalmente boas e nem totalmente más é que vai integrando esses aspectos dentro de si mesma. Dessa forma as experiências emocionais gratificantes (boas) e as frustrantes (más) passam a coexistir dentro dela e na sua relação com as pessoas e com o ambiente que a cerca. Esse progresso no desenvolvimento emocional permite que a criança aceite melhor as adversidades e restrições pois as frustrações deixam de ter um caráter tão terrivelmente ruim na medida em que também são consideradas as experiências boas. Surge também a culpa e o medo de perder o outro, a tendência a querer reparar o "mal" que na sua fantasia cometeu, a preocupação da criança não esta mais tão centrada em si mesma, existe também uma preocupação genuína pelo outro.
Esse progresso é um processo lento e trabalhoso. Quem pode ajudar a criança nesse sentido é o adulto, os educadores, e sobretudo, os pais. Para tanto, é fundamental que os adultos também possam aceitar os limites e as frustrações da vida, considerando os aspectos da realidade (princípio da realidade), ou seja, o adulto possa compreender que frustrar o filho (dar limites) não é ser "mau", e sim, dar-lhe proteção e cuidado. Se isto não está sendo possível, as "regras" de como educar e castigar acabam falhando.
É preciso que os pais possam aceitar as reações de agressividade e sofrimento dos filhos perante suas frustrações, de maneira a permitir que eles se desenvolvam. Freud dizia que a capacidade para pensar é uma atividade bastante complexa, que só pode se desenvolver no ser humano quando ele é capaz de se confrontar com obstáculos e dificuldades para, a partir daí, encontrar novas soluções a alternativas. O sofrimento faz parte da vida e, tentar poupar os filhos dessas experiências, é prejudicá-los no enfrentamento da vida. Nesse sentido, o que a psicanálise nos mostra é que só através dessas vivências a criança pode formar um aparelho mental mais fortalecido.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O JOGO DO AMOR

Somos criados para pensar que não. O amor é um jogo? Que absurdo, ora essa. O amor é pra ser sentido, demonstrado, percebido, e não racionalizado. Joguinhos, se existirem, só devem fazer parte do começo das relações afetivas, é o que nos acostumamos a pensar. De resto, deixa o coração falar mais alto.
E do “alto” dos meus 44 anos, com algum aprendizado sobre relacionamentos, hoje me arrisco a dizer que o amor pode ser um jogo, sim. Quem nunca pensou que “quando demonstro que gosto muito de alguém, a pessoa se acomoda”? Que relacionamento, por mais apaixonado que seja, resiste às não- renovações diárias de demonstrações de carinho, respeito e confiança?
Não é que tenhamos que medir cada palavra, cada gesto com quem amamos. Mas faz parte, sim, oferecer confiança em excesso em alguns momentos, e permitir um pouco de insegurança em outros. Sentir-se em uma relação estável, mas saber que é necessário conquistar e ser conquistado novamente dia após dia para manterem-se juntos. Faz parte do ser humano, ainda que não tenha consciência disso, não querer sentir-se seguro o tempo todo ao lado de alguém. Se não houver o risco de perda, o que pode se perder é a graça.
Conversando sobre os “jogos do amor” com uma paciente, me deparei com uma analogia muito interessante e que compartilho com vocês dada a simplicidade, ao mesmo tempo em que é profunda. Ela comparou o amor a partidas de tênis e de frescobol. Duas pessoas que jogam tênis têm em comum o objetivo de vencer, o que acarreta, necessariamente, na derrota de um dos dois. Os participantes são chamados de adversários e mandam “bolas ruins” um pro outro, porque o erro de um significa o acerto do oponente.
No caso do frescobol, olha que interessante. Não há vencedor nem perdedor, e comumente os pontos nem são contabilizados. Duas pessoas mandam “bolas boas” uma pra outra com o único objetivo de se divertir e não deixar que a bola caia, porque isso sim acabaria com a partida, ou resultaria no seu recomeço.
Como no jogo do amor funciona parecido! Há casais que jogam tênis sem perceber, e em vez de buscarem cumplicidade, diversão mútua e se preocuparem apenas em manter a bola no ar, disputam a vitória – que nunca chega, porque a “derrota” de um implica sempre no sofrimento também do outro. Por mais óbvio que pareça, como é difícil jogar frescobol! Não concorrer nem disputar, jogar o jogo do amor de modo que os dois sejam parceiros e não adversários, sem contabilizar pontos e percebendo que quando um recebe “bola boa”, o outro ganha também. Os dois, portanto, são vencedores, se não ao mesmo tempo, pelo menos se alternam nesse papel.
A bola caiu! E agora? Para tenistas, isso pode significar o fim da partida - a glória de um e a desgraça do outro. Pra quem joga frescobol, a queda também pode resultar no término da partida, ou não – é uma decisão que cabe aos dois que jogam. Afinal, não há pontuação, nem juiz, nem mesmo torcida – contra ou a favor. Há apenas duas pessoas que, se quiserem, podem continuar jogando juntas, tentando se divertir mantendo a bola no ar, mesmo sabendo que às vezes ela vai cair, inevitavelmente. E que em todas as vezes que isso acontecer, provavelmente um vai ter mais vontade de apanhar a bola do que o outro, porque o ser humano é complexo assim.
A partida continua se ambos concordam que não querem ser oponentes, e que apesar de já terem perdido antes, desejam continuar jogando. Talvez porque o jogo valha a pena, por si só. Talvez porque, mesmo sem certezas pro resto da vida, queiram manter a bola no ar. Ou simplesmente porque – e aí temos o exemplo da nossa dupla de vôlei de praia feminina nas Olimpíadas, que têm dificuldades em se entrosar porque nunca tinha jogado juntas -, aquela parceria é insubstituível.
O dono da bola e das raquetes sabe que não vai achar alguém com quem ele tenha tanta vontade de jogar. E quem joga com ele sabe que pode escolher jogar com outras pessoas, mas é essa bola que caiu na areia que ele quer manter no ar.

A MULHER APAIXONADA

A mulher pode estar gostando, pode estar envolvida, pode estar a fim, pode estar impressionada. Em todos esses estados pode se relacionar amorosamente.Mas a mulher apaixonada está em outro astral. Tudo nela, principalmente certos mecanismos inaprisionáveis por palavras, fala de paixão. É um certo jeito de se acalmar dentro da maior tensão, é a postura dos braços, é algo nas glândulas da pele, no olho, na respiração.
A mulher apaixonada é um ser em estado de torcida do Flamengo. Torce mais pelo amado que pela Seleção. Entra no campo, agride o juiz, salta o alambrado, topa qualquer desafio. Só vê vitória. O único ser que topa qualquer parada não é o herói, o desesperado ou o valente: é a mulher apaixonada. Vai pro exílio, larga profissão, conveniência, partido político. Só tem um caminho e uma verdade: o amor. O resto virá depois. Sem ele, o tudo é nada.
A mulher apaixonada é o mais paciente dos seres impacientes. Sempre em estado de “estou pronta”, suporta anos esperando com maravilhosa impaciência, exigência, dedicação, entrega, cegueira, vontade de quintais e praias, as amarrações que supõe perfeitas e definitivas. Ninguém vive a provisoriedade com tanto sentido de permanência. Ninguém assina em branco e antecipa tantos avais de afeto. Ninguém erra com tanta convicção e decência.
Fera e santa, guerreira e gato, desastrada e genial, capaz de usar fitas, meias coloridas, blusas-bobagem; uma campainha nos joelhos; uma joaninha de verdade na testa; de enfrentar solidões, distâncias, presenças, piratas e furacões pelo ser amado, a mulher apaixonada é o mais regular dos seres irregulares, porque não julga, não pensa, não avalia, só sente.
E que se danem o mundo, as regras, as regulações, conveniências, aparências, seguranças, convenções, disposições, legislações e tudo aquilo que mamãe me ensinou! Que o mundo exploda em flores!
Ser de grandezas, só vive de migalhas. Ser de farturas, alimenta-se de ar, nuvem, vontade, espera e sonho. Quem se supõe apaixonada e trocar uma nuvem por um sanduíche está é com fome, não com paixão. Está doente de saúde e não saudável de doença de amor.
A mulher apaixonada é um ser em estado de entendimento de pedaços da vida desconhecidos pelo comum dos mortais: entende de lençóis iluminados pela luz do corredor nas noites sem sono, conhece ruídos diferentes de tique-taques, entende de meio-fio, de paredes chutadas, de cantores e poetas escolhidos secretamente, de confidências contadas para as toalhas.
Domina computadores afetivos encarregados de arquivar e interpretar as mensagens mais sutis do amado: tom de voz, espaço entre uma e outra frase, fomes dominicais, impressões vagas de cansaço, tédio, alegria ou saudade expressas por fungados, suspiros, desabafos, interjeições, gestos, sons, olhares, todos tabulados no seu “compoetador”, perfurado pela esperança e perfumado pela possibilidade.
A mulher apaixonada mistura bola de gude com Heidegger; borboleta com suco de pitanga; laquê com desejo; talão de pedágio com metafísica; sapato de tênis com Brahms; sanduíches de mortadela com informática; distração com rejeição; perturba-se de tanta lucidez; tolda- se de tanta nitidez; mancha-se de tanta pureza; confunde-se de tanto autoconhecimento; engana-se de tanta verdade; embaraça-se de tanta decisão; entendia-se de tanta disposição.
Ela mistura disposição com vontade. Possibilidade com ânsia. Dificuldade com não querer. Em suma: é o mais incapaz dos capazes do que há de melhor, mais lindo, legítimo e verdadeiro.
A mulher apaixonada vive de farol alto, não desliga a buzina, não fecha bico de gás, só anda de pé da tábua, ouve tudo em 78 rotações, força a barra, anda na contramão, joga pedra no telhado do vizinho, vai depressa com o andor, desassossega o leão, cutuca a fera com vara curta, gasta pólvora com chimango, perde tempo, ganha o sonho, vive o susto, varre o medo, enfrenta a frota, esmaga o espanto, esbarra no afago, espera a vida, encontra a razão, fala de boca cheia, assovia e chupa cana, beija a madrugada, insulta a acomodação, instala o reino da validade.
Ela é: especialista em pretextos, modista de oportunidades, cozinheira de chances, pediatra de carências, jardineira de manhãs, pastora de indícios, navegante de esperanças, fiandeira de frustrações, colhedeira de instantes, tecelã de ternuras, miúra de girassóis, doceira de amarguras.
A mulher apaixonada é furacão e chuvisco; exaltação e placidez, adivinha e alienada, sábia e patusca, maravilha e susto, mãe e mulher, filha e bruxa, santa e desastrada. A mulher apaixonada é, em suma, o ser que atende e representa em profundidade, em delírio, em sofrimento e em glória, a criança carente que mora em nós.
**Artur da Távola